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segunda-feira, 8 de julho de 2019

A vaidade é má conselheira





Certa manhã o poderoso sultão El-Khamir mandou vir à sua presença o prefeito da cidade e lhe disse: – Prefeito, casualmente me levantei nessa noite e cheguei à janela. Ao longe avistei, no meio da escuridão da cidade, uma pequena luz azul muito viva e brilhante. Estou intrigado e desejo saber quem passou a noite a velar. Ordeno-lhe que abra rigoroso inquérito a fim de apurar a razão dessa vigília.

O prefeito se inclinou e disse: - Respeitosamente senhor, parece-me inútil esse inquérito. Cumpre-me dizer que aquela luz provinha do oratório da minha casa! 

Diante do espanto indisfarçável do sultão, ele acrescentou: – Eu e minha família passamos a noite em orações, pedindo a Deus pela preciosa saúde de vossa majestade! 

Surpreso disse o sultão: – Obrigado, meu bom amigo. Em muito tenho sua amizade e dedicação! Saberei corresponder aos seus cuidados.

Assim que o prefeito se retirou, o sultão mandou chamar seu Grão-vizir, que tinha na corte as funções de ministro. Disse o sultão: – Meu caro ministro, resolvi recompensar com mil dinares de ouro o prefeito da cidade. 

O ministro espantado disse: – Mil dinares de ouro! Por Allah! É muito dinheiro! – Que fez o prefeito para merecer tão grande quantia? 

O sultão narrou com a maior simplicidade o caso da luz azul e justificou a doação. Porém disse o ministro: – Permita-me ponderar, mas o soberano está sendo iludido por esse homem indigno. Posso provar que o prefeito não tem família e apenas ora na mesquita quando é obrigado. Vive miseravelmente, como um avarento, em um sórdido casebre para além do bairro judeu.

O soberano ficou surpreso e insistiu: – Mas… e a pequena luz azul? Logo o ministro contraveio: – Vejo-me obrigado a confessar a verdade. A pequena luz azul vista por vossa majestade, era a lâmpada de azeite que ilumina a minha sala de estudos. Passei a noite acordado cogitando acerca dos graves problemas e das múltiplas questões que vossa majestade deve resolver na audiência de hoje! Juro que é a verdade!

Radioso o ingênuo soberano falou: – Grande e esforçado amigo! Como admiro esse seu amor ao cumprimento do dever! E, jubiloso, disse-lhe: – Tereis brevemente uma recompensa digna da vossa dedicação! 

Mal se retirara o ministro, mandou o soberano chamar o general das tropas e contou-lhe que estava resolvido a conceder o título de xeique ao seu digno ministro. Por isso o general deveria destacar quinhentos soldados para ficar permanentemente à disposição do novo dignitário do Hedjaz.

Sem nada ocultar, contou a história da luz azul. Logo o general disse: – E vossa majestade acreditou nas falsas palavras do ministro? Peço especial permissão para provar que esse audacioso vizir mentiu como um infiel! Vejo-me agora obrigado a revelar que a pequena luz azul que atraiu a atenção de vossa majestade provinha apenas da minha tenda de campanha! Diante de um provável levante revolucionário, tive receio de que viessem atacar o palácio real e para garantir a vida do soberano e fiquei acampado nas cercanias da cidade. Exclamou o sultão: - Por Deus! Que valentia! Tereis brevemente uma recompensa digna da vossa dedicação!

Assim que o general se despediu, o sultão cogitou conceder ao general o título de príncipe de Hedjaz. Porém pensou que tamanha dedicação mereceria muito mais, por isso resolveu consultar o seu velho mestre e conselheiro. 

O velho sábio ponderou: – Na minha fraca opinião, vossa majestade não deve acreditar nem no prefeito, nem no ministro, nem no general. Creio que a tal luz azul provém do novo farol de El-Basin, que indica aos navegantes a entrada do porto, assegurando-lhes o bom caminho em noites de tormenta. 

Quando chegou a noite, o sultão foi verificar a tal luz do farol. Ao estender o olhar sobre o panorama da cidade, uma surpresa estranha o aguardava. Como todos já tinham conhecimento das prometidas recompensas, a cidade surgiu naquela noite, extraordinariamente iluminada por luzes azuis. Então o crédulo soberano compreendeu, que para cada súdito honesto e honrado de seu reino, havia um milhão de mentirosos e bajuladores...




Moral da estória

Tenha em mente que a vaidade é má conselheira. 
Se um líder incentiva o oportunismo dos bajuladores de plantão,
 perde a oportunidade de incentivar um bom trabalho... 
(Conto de Malba Tahan)



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Quem sou

Nascida em Belo Horizonte, apaixonada pela vida urbana, sou fascinada pelo meu tempo e pelo passado histórico, dois contrastes que exploro para entender o futuro. Tranquila com a vida e insatisfeita com as convenções, procuro conhecer gente e culturas, para trazer de uma viagem, além de fotos e recordações, o que aprendo durante a caminhada. E o que mais engradece um caminhante é saber que ao compartilhar seu conhecimento, possa tornar o mundo melhor.

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